Mais de 90% dos funcionários da Globoaves estão sem trabalhar

Apuração exclusiva do Jornal Correio aponta que apenas 20 dos 300 colaboradores estariam trabalhando normalmente, enquanto o restante, em casa há 30 dias, recebe parte do salário como bolsa qualificação. Empresa diz que espera voltar a operar a plena carga em fevereiro

O frigorífico Globoaves, unidade de Laranjeiras do Sul, enfrenta uma possível crise que ameaça centenas de empregos na cidade. De acordo com colaboradores que pediram para não serem identificados, a produção estaria paralisada desde o final de outubro, com a suspensão dos abates e da compra de insumos. Antes da paralisação, a planta abatia cerca de 1.250 suínos por dia, destinados ao mercado nacional e à exportação sob a marca Valesul. Apuração exclusiva do jornal Correio levantou que atualmente apenas 20 funcionários estão indo para a empresa, enquanto cerca de 280 estão afastados e recebendo auxílio parcial, que gira em torno de 60% do salário normal, até o teto do INSS. No caso de estagiários, um salário mínimo.

Bolsa qualificação

Os trabalhadores afastados estão recebendo um benefício chamado ‘bolsa qualificação’, que substitui parte dos salários. No entanto, o valor não corresponde ao total da remuneração anterior, o que tem gerado preocupação entre os empregados e agravado a situação financeira de muitas famílias.

“Dediquei boa parte da minha vida aqui. Agora, estou envelhecendo e preocupado com a possibilidade de não conseguir um emprego que pague o mesmo que recebo hoje”, desabafa um colaborador com mais de 20 anos de empresa. Outro funcionário comenta que há rumores de retomada das atividades em fevereiro. “Dizem que tudo voltará ao normal, mas temo que isso não aconteça e eu tenha que buscar outra ocupação”.

Possível venda ou negociações

Embora o site da empresa ainda indique que o abate de suínos segue em operação, funcionários relatam que as atividades estão suspensas há mais de 30 dias. Surgiram boatos de que a Cooperativa Lar poderia assumir a unidade, ou que uma venda estaria sendo negociada. Entretanto, até o momento, não há nada oficial, e a empresa nega a venda. De acordo com Bruno Dias, responsável pelo setor de marketing da Globoaves, a empresa espera que a redução no número de funcionários ativos seja temporária. “Nossa expectativa é que o cenário econômico se estabilize nos próximos meses, permitindo a retomada do abate em fevereiro de 2025”, diz nota oficial.

O que diz a lei

De acordo com a advogada trabalhista e sócia do escritório de advocacia Cruz e Prior Advogadas Associadas de Laranjeiras do Sul, Géssica Oliveira da Cruz, o auxílio financeiro recebido pelos empregados durante a suspensão contratual é conhecido como bolsa de qualificação profissional e é custeado pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). “A gestão desse benefício é feita por meio do seguro-desemprego, seguindo regras específicas da legislação trabalhista”, explica.

Sobre a legalidade da medida, ela destaca que precisa de acordo. “A suspensão contratual pode ser implementada comnecessidade de acordo ou convenção coletiva, e deve ser firmada mediante acordo individual escrito com o empregado, conforme o artigo 476-A da CLT. Porém, a ausência de negociação coletiva pode gerar invalidade da medida”.

A advogada também orienta sobre os direitos dos trabalhadores. “Os empregados mantêm benefícios previstos em contrato, como plano de saúde, e têm direito à estabilidade provisória de três meses após o término da suspensão, salvo disposição em contrário. O curso deve ser legítimo e relevante para a qualificação do empregado, caso contrário, a suspensão poderá ser anulada, com pagamento retroativo de salários e encargos”.

Em caso de encerramento das atividades ou transferência da unidade, a especialista esclarece que os direitos variam. “Se a empresa fechar definitivamente, os trabalhadores têm direito às verbas rescisórias, incluindo multa de 40% do FGTS e seguro-desemprego. Já em caso de sucessão empresarial (venda), o novo empregador assume os contratos de trabalho, preservando os direitos dos empregados”, explica Géssica.

A advogada reforça que cada caso deve ser analisado individualmente. “É essencial que os trabalhadores consultem um advogado de confiança para verificar possíveis irregularidades e avaliar se há necessidade de ingressar com uma reclamatória trabalhista”.

Posicionamento da empresa

“Atualmente, a unidade está operando com cerca de 200 colaboradores em regime de bolsa qualificação. Essa medida foi adotada temporariamente devido ao aumento significativo nos custos de produção de suínos, o que impactou diretamente a competitividade e a viabilidade econômica das operações de abate. Como resultado, o abate foi reduzido, visando preservar a sustentabilidade da operação e assegurar a retomada em condições mais favoráveis.

Reiteramos que a redução no número de funcionários ativos é temporária. Nossa expectativa é que o cenário econômico se estabilize nos próximos meses, permitindo a retomada do abate em fevereiro de 2025. Durante este período, a bolsa qualificação está sendo utilizada para garantir que os colaboradores permaneçam capacitados e preparados para o retorno das atividades.

Esclarecemos também que o frigorífico não está em processo de negociação de venda. Apesar do cenário desafiador, nossa prioridade permanece sendo a recuperação das operações e o fortalecimento de nossa presença no mercado, de forma alinhada às condições econômicas e à nossa visão de longo prazo.

Agradecemos a compreensão de todos e reforçamos nosso compromisso com a transparência e a responsabilidade em relação a nossos colaboradores, clientes e parceiros”, diz a nota.