A morte e a morte de Quincas Berro D’Água

Jorge Amado (1912-2001) nascido Jorge Leal Amado de Faria é o segundo escritor brasileiro de maior número de vendas de livros sendo superado apenas por Paulo Coelho. Jorge Amado é o autor mais adaptado do cinema, do teatro e da televisão brasileira. Sua obra é formada por 49 livros, os quais foram publicados em 80 países e traduzidos para 49 idiomas. Ganhou inúmeros prêmios nacionais e internacionais e foi eleito em 1961 para a Academia Brasileira de Letras. Jorge formou-se em Direito, porém, jamais exerceu a advocacia. Tendo estudado na década de 1930 na Universidade Federal do Rio de Janeiro, tomou conhecimento dos ideais do Partido Comunista Brasileiro (PCB), no qual se filiou, tendo sido eleito deputado federal em 1946. Sua atuação como parlamentar esteve entre outras ações pautadas na defesa da garantia da liberdade religiosa para os cidadãos. Ao se postar ideologicamente à esquerda tanto em suas obras como na política foi obrigado a viver exilado na Argentina, no Uruguai, em Paris e em Praga no período em que Vargas esteve no poder. Jorge Amado era vigiado tanto pela CIA quanto pelos serviços de inteligência da ex-União Soviética. Ao tomar conhecimento das atrocidades praticadas por Stalin na União Soviética, as quais foram reveladas pelo Secretário Geral do PCUS Nikita Krushev, desligou-se do Partido Comunista Brasileiro. A obra de Jorge Amado é essencialmente dedicada às raízes nacionais e suas máculas. Sendo assim, nela estão presentes os problemas nacionais e as injustiças sociais, mas, também o folclore, a política, as crenças, as tradições e a sensualidade do povo brasileiro. Dentre os grandes sucessos adaptados para a telinha e para a telona estão Dona Flor e seus dois maridos, Tenda dos milagres, Tieta do Agreste, Gabriela, cravo e canela e Tereza Batista cansada de guerra. Jorge Amado era muito estimado pelo povo baiano, especialmente as pessoas adeptas do sincretismo religioso que tão bem caracteriza a cidade de Salvador. Muito bem relacionado, teve a amizade de grandes nomes da literatura nacional como Érico Veríssimo, Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Mário de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Monteiro Lobato e Gilberto Freyre. Também trocou correspondências com Pablo Neruda, Gabriel Garcia Marquez e José Saramago.¹

Na novela aqui resenhada, Joaquim Soares da Cunha é um cidadão respeitável, servidor público dedicado e honrado marido e pai cuja família goza de prestígio junto a tradicional sociedade de Salvador. Joaquim vive uma vida pacata, porém, não é feliz da porta para dentro de casa, afinal é ali que a vida real acontece. A esposa de Joaquim é mais rígida que qualquer chefe que ele teve no funcionalismo público. Sua filha é uma cópia de sua esposa no temperamento. Quando completou cinquenta e cinco anos, Joaquim se aposentou e decidido a viver melhor o resto de sua vida, abandonou a esposa e a casa, largou as amizades que mantinha com as pessoas de sua classe social e passou a viver na rua, frequentando prostíbulos e bares nos quais bebia muito. Em certa ocasião, Quincas (como lhe chamavam) se encontrava num bar e serviu-se do líquido que havia em uma garrafa transparente e ao sorver o primeiro gole, cuspiu e gritou: é água! A partir desse momento foi apelidado de Quincas Berro D’Água. Quincas tinha nos vagabundos, nas prostitutas, nos jogadores de baralho, nos moradores de rua, seus amigos da nova vida, afinal, tivera uma morte social (primeira morte) quando abandonou a família e as amizades que mantinha na tradicional sociedade de Salvador. Em sua nova vida, Quincas não tinha preocupações quanto a comportar-se adequadamente para manter a reputação sua e/ou de sua família. A família é que se preocupava, pois Quincas que tantas vezes frequentara a coluna social dos jornais, agora neles aparecia cada vez que se metia em confusão e era preso, sendo que a família era obrigada a fazer esforços para retirá-lo da cadeia. A preocupação da ex-esposa e da filha (que se casara) era com os vexames que Quincas causava ao bom nome da família perante a sociedade. De nada adiantava, aconselhar Quincas, ele xingava todo mundo e voltava para a vida boêmia. Considerava seu genro um bestalhão (mandado pela jararaca da sua filha), como ele um dia fora por sua mulher, mas, ele tivera coragem de se libertar, seu genro não.

A vida desregrada de Quincas ia bem, ou pelo menos, como ele desejava, até que ele morre (segunda morte). Seus amigos de bebedeira, de jogatina bem como as prostitutas ficam tristes com sua morte e tentam lhe dar o velório que (Quincas que tanto amava a vida) gostaria de ter, porém, sua família busca o corpo e deseja dar a ele um velório digno da classe social a que a família pertencia, enaltecer as boas qualidades de Joaquim Soares da Cunha e com isso apagar do imaginário social a má imagem do boêmio e vagabundo que ele se tornara. A morte de Joaquim é de certa forma um alívio para a família, afinal, virada essa página, não haveriam mais vexames a manchar a reputação da família perante a sociedade. O imbróglio é que a família conservadora e os amigos da vida desregrada não concordam com o formato do velório que o morto merece e gostaria de ter e, passam a disputá-lo. Salvar a reputação ou fazer uma despedida de arromba desse mundo? É a questão! Para evitar spoiler, paro aqui. Fica a dica!

Referência:

1. Wikipédia.

Sugestão de boa leitura:

Título: A morte e a morte de Quincas Berro D’Água.

Autor: Jorge Amado.

Editora/Ano: Companhia das Letras, 1ª edição, 2008, 120 p.