O Oscar como devolução do corpo de Rubens Paiva

Quando esta coluna for publicada, o Oscar do filme “Ainda estou aqui” que turbinou o Carnaval, não será mais notícia recente, mesmo assim, resolvi retomar o tema. Trata-se de um feito esplêndido, tendo em vista ter sido produzido em língua não inglesa, o que, por si, já diminui suas chances. Quem o assistiu, certamente entendeu porque ele foi indicado e premiado. Obviamente, ficou uma decepção pelo fato de a magnífica Fernanda Torres não ter ganho na categoria Atriz, no entanto, ela trouxe o Globo de Ouro, o que não é pouco.

Vi muitas críticas ao filme partindo de pessoas saudosistas da ditadura militar (1964-1985) e, também de jovens alienados, pois destes últimos, somente uma formação insuficiente e acrítica consegue explicar seu posicionamento reacionário. Houve quem falou que o filme consumiu recursos da Lei Rouanet, algo que não é verdadeiro. Se fosse, tais recursos teriam sido muito bem aplicados, pois projetou positivamente a imagem do país no exterior. A Lei Rouanet permite que pessoas e empresas apliquem recursos financeiros em projetos culturais e possam deduzi-los do Imposto de Renda. Tais críticas à Lei Rouanet são injustificadas, principalmente em um país, onde pensões vitalícias são pagas a filhas “solteiras” de Generais e no qual o poderoso Agronegócio é fortemente subsidiado e desonerado de impostos de exportação.

O filme “Ainda estou aqui” é pedagógico e faz justiça não somente à Eunice Paiva e família, como também às pessoas que foram arbitrariamente presas, torturadas e mortas durante a ditadura militar. A Lei de Anistia (1979), embora comemorada por uma nação cansada e traumatizada pelos “anos de chumbo”, acabou por dar salvo conduto no período pós-ditadura, aos militares criminosos. Ocorre que crimes contra os Direitos Humanos como a tortura, pelo Direito Internacional são imprescritíveis, inafiançáveis e não poderiam estar cobertos pela referida lei. Há um processo no STF que transita tão desinteressada e lentamente que os criminosos estão falecendo de velhos sem jamais terem sido julgados.

O filme, um orgulho nacional, se eternizará na história nacional e na mente das pessoas. Também deve se eternizar o pensamento expresso pelo saudoso Ulysses Guimarães (1916-1992), o “Senhor Constituinte” que no discurso histórico de promulgação da Constituição Federal (1988) disse: “temos ódio e nojo à ditadura”. A impunidade estimula o golpismo! Sem anistia! Tortura nunca mais! Ditadura nunca mais!

P.S. O título foi retirado de fala do ator Selton Mello sobre o filme.