Estudo indica infarto e AVC associados ao uso inadequado de implantes hormonais
45,9% são pacientes com itens manipulados, sendo 63% mulheres, enquanto 34% estão ligados a hormônios intramusculares. O “chip da beleza” é um dos mais comuns, utilizado para emagrecimento e tratamentos estéticos
O uso inadequado de implantes hormonais manipulados e esteroides no Brasil pode estar ligado a 257 complicações de saúde, incluindo duas mortes. Esses dados fazem parte de um levantamento realizado por sociedades médicas no estudo “Vigicom Hormônios: Observatório do Mau Uso de Hormônios”, que revela os riscos associados ao uso impróprio de hormônios, especialmente para fins estéticos.
A plataforma Vigicom Hormônios, desenvolvida pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) e pelo programa ‘Bomba Tô Fora’, em colaboração com a Associação Médica Brasileira (AMB), busca quantificar os efeitos adversos do uso inadequado de hormônios. Médicos podem relatar casos de uso impróprio, como para fins estéticos, sem indicação ética ou comprovação científica.
Chips
Do total de casos reportados, 45,9% envolvem pacientes utilizando implantes hormonais manipulados, com predominância feminina (63%), com média de idade de 42,9 anos. Outros 34% estão relacionados a hormônios de uso intramuscular. Um dos implantes mais comuns, conhecido como “chip da beleza”, é prescrito para emagrecimento, tratamento da menopausa, antienvelhecimento, redução da gordura corporal, aumento da libido e da massa muscular.
Esses implantes podem conter diversas substâncias, como testosterona e gestrinona, um progestágeno com efeito androgênico. Também podem incluir estradiol, oxandrolona, metformina, ocitocina, entre outros hormônios.
Importante destacar que os implantes hormonais não têm aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para uso comercial. Além disso, não possuem bula ou informações adequadas sobre farmacocinética, eficácia ou segurança. Atualmente, existe apenas um tipo de implante hormonal aprovado pela Anvisa, o Implanon, que é composto por etonogestrel e atua como método anticoncepcional.
Uso inadequado com foco na estética
O levantamento indica que a motivação estética é a principal razão para o uso inadequado de hormônios e implantes hormonais manipulados. Dentre os casos analisados, 45,9% relataram o uso para fins estéticos, como emagrecimento ou ganho de massa muscular. Outros 37% utilizavam os hormônios para combater o cansaço, e 29,2% para tratar sintomas de menopausa ou “andropausa”.
Complicações graves
O estudo revelou que 20,3% dos pacientes que usaram implantes hormonais manipulados precisaram de internação hospitalar, e 5,1% requereram cuidados intensivos. As complicações de saúde mais comuns incluíram hipertensão, infarto e AVC. A gestrinona foi a substância mais relacionada a complicações (49,2%), seguida pelos derivados de testosterona (53,4%). A motivação estética (52%) e o combate ao cansaço (46,6%) permaneceram como as principais razões para o uso.
As duas mortes reportadas ocorreram em decorrência de infarto agudo do miocárdio, após o uso de testosterona intramuscular, e por taquiarritmia e tromboembolismo pulmonar.
A SBEM afirmou em um comunicado que “os dados mostram que o uso inadequado de hormônios pode ter consequências extremamente graves, indo muito além dos resultados estéticos desejados”.
Sociedades médicas pedem regulamentação à Anvisa
O relatório do Vigicom Hormônios visa fortalecer a regulamentação sobre a prescrição e comercialização de implantes hormonais manipulados. As sociedades médicas pretendem usar os dados para solicitar à Anvisa que corrija as brechas na legislação que permitem a produção em larga escala desses produtos.
Em agosto de 2024, 32 sociedades médicas protocolaram uma proposta de regulamentação à Anvisa. Até o momento, a agência não se manifestou sobre o assunto.