Educação Financeira prepara jovens paranaenses para o futuro

Esse acréscimo no currículo escolar tem tudo para render bons frutos duradouros, como aponta um estudo publicado pelo Grupo de Pesquisa de Desenvolvimento Econômico do Banco Mundial

Mesmo com os colégios ainda fechados em virtude da pandemia, a educação pública do Paraná não parou e inovou com a implementação de novas aulas e plataformas de apoio para professores e estudantes. Uma das principais mudanças aconteceu no início de 2021, quando a Secretaria de Estado da Educação e do Esporte (Seed-PR) incluiu a Educação Financeira como um novo componente na matriz curricular no ensino médio, iniciativa pioneira no País, com uma aula por semana específica sobre a temática.

Por meio do desenvolvimento de competências necessárias para o uso consciente do dinheiro, do gerenciamento do consumo e planejamento financeiro, o ensino tem como objetivo fazer com que os estudantes possam, desde jovens, fazer escolhas mais assertivas, aumentando o domínio, controle e conhecimento do tema.

Por consequência, a ideia é ampliar a parcela de cidadãos autônomos em relação a suas finanças pessoais, uma vez que tanto a nível estadual como nacional uma parcela significativa da população vive constantemente com as finanças desequilibradas e, parte dela, por falta de planejamento e conhecimento sobre o assunto (não necessariamente somada ao orçamento apertado).

Neste ano, com o início do novo ensino médio para a primeira série – e o aumento de 25h para 30h horas-aula na semana – a disciplina passou a ter duas aulas semanais, que será o padrão para todas as séries da modalidade no novo formato.

Também neste ano, a Educação Financeira entrou na matriz curricular da modalidade integral do ensino fundamental anos finais (com uma aula por semana, para 6º e 7º anos, e duas aulas semanais para 8º e 9º anos). Ao todo, cerca de 400 mil alunos estão com a disciplina com uma ou duas aulas na semana e, além disso, quem está no 8º e 9º anos regulares do fundamental também tem contato com o tema dentro de uma das aulas semanais de Matemática.

Dentro das aulas, os professores trabalham a relação com as finanças em diversos conteúdos com um olhar interdisciplinar, estabelecendo conexão entre objetos do conhecimento e o contexto do dia a dia e do mundo real, como a necessidade de consumo, a relação com o dinheiro: formas de obtê-lo, poupá-lo e investi-lo, vantagens e desvantagens no uso do crédito (juros), causas e consequências do endividamento excessivo, diferenciação de ativos e passivos, poupança, investimentos e previdência, análise do mercado de trabalho e empreendedorismo.

Projeções para o futuro

Esse acréscimo no currículo escolar tem tudo para render bons frutos duradouros, como aponta um estudo publicado neste último mês de julho pelo Grupo de Pesquisa de Desenvolvimento Econômico do Banco Mundial.

Menor uso de fontes caras de crédito, maior propensão ao empreendedorismo e menos atrasos no pagamento de empréstimos: essas são algumas das conclusões da publicação intitulada “The Long-Term Impact of High School Financial Education: Evidence from Brazil”, em tradução livre “O impacto a longo prazo da educação financeira no ensino médio: evidências do Brasil”, que analisou o impacto de uma década sobre um abrangente programa de educação financeira realizado entre 2010 e 2011 com mais de 20 mil alunos de 892 escolas públicas de seis estados do país.

À época foram formados pares de escolas parecidas entre si e, de cada par, foi sorteada uma escola para receber a ação. A escola que recebeu a ação passou a compor, então, o chamado “grupo de tratamento”, enquanto a outra (que não recebeu a ação) passou a compor o “grupo de controle”. Em 17 meses, o conteúdo foi integrado no currículo de aulas de Matemática, Ciências, História e Língua Portuguesa, com material didático adequado e treinamento de professores.

O estudo randomizado controlado – método de pesquisa rigoroso para determinar se existe uma relação de causa e efeito entre uma intervenção e um resultado – foi alvo de estudos de curto e longo prazo. Em 2013, uma análise dos resultados no curto prazo foi publicada e reconheceu que os “impactos não eram bem compreendidos”, embora trouxesse impactos positivos com um aumento na poupança para compras, melhor possibilidade de planejamento financeiro e maior participação nas decisões financeiras domésticas dos alunos do grupo participante do programa.

Agora, um novo estudo consolidou os efeitos de longo prazo ao acompanhar cerca de 16 mil dos atualmente ex-alunos por nove anos – até fevereiro de 2020. Esse é, segundo os quatro pesquisadores, o primeiro estudo a apresentar evidências de longo prazo sobre a eficácia do ensino por meio do estudo randomizado analisando em conjunto diversos registros administrativos (do Banco Central do Brasil e do Governo Federal), como titularidade de contas bancárias (mas não os saldos delas), uso de vários produtos de crédito, bem como informações sobre a situação de emprego formal e propriedade formal de microempresa.

“Os alunos do grupo de tratamento são significativamente menos propensos a usar o crédito do que os alunos de controle, particularmente em as categorias de crédito mais caras: cartões de crédito e cheque especial. Estudantes de tratamento são 1,4% menos propensos a ter dívidas de cartão de crédito e 0,9% menos propensos a usar cheque especial, em comparação com 23% dos alunos de controle com dívida de cartão de crédito e 11% no cheque especial. Ambos os efeitos persistem ao longo do tempo, ou seja, são igualmente fortes oito nove anos após o término do programa de educação financeira, assim como cinco a sete anos após o programa”, diz o estudo.

“Também descobrimos que o programa levou a uma menor probabilidade de ter empréstimos com atrasos de pagamento a longo prazo, em cerca de 0,9%, em comparação com 15% dos alunos de controle que têm empréstimos com atrasos”, complementa outro trecho.

Ao analisar dados de propriedades de microempresas, os pesquisadores descobriram que os alunos que tiveram as aulas de educação financeira “não são mais propensos a serem microempreendedores do que alunos de controle de um a sete anos após o fim do ensino médio [quando ainda podem estar na universidade], mas de oito a nove anos depois do ensino médio [quando a maioria estava provavelmente no mercado de trabalho], os estudantes de tratamento são 10% mais propensos a possuir uma microempresa do que alunos de controle [um aumento de 0,69% em relação a 6,9% alunos de controle com um MEI]”.

Por fim, os pesquisadores concluem que “unindo esses resultados, descobrimos que o programa de educação financeira do ensino médio teve efeitos significativos e duradouros sobre o comportamento econômico de longo prazo relacionado ao uso de crédito e nos resultados de emprego. O programa transferiu o emprego do setor formal para o empreendedorismo, que pode ser um efeito desejável mesmo que algumas das microempresas criadas devido ao programa sejam informais”.